quinta-feira, 24 de julho de 2008


O que realmente acalma o ser humano?

Acabei de consultar uma designer de interiores e decoradora. O objetivo é podermos oferecer um ambiente agradável aos nossos pacientes em nossa sala de espera em São Paulo. Entre inúmeras informações valiosas, ela me ensinou que "a simetria acalma e tranquiliza o ser humano, inexplicávelmente". Se eu tivesse ouvido que a imagem de uma pradaria bucólica, um campo florido ou um lago sereno acalmam (como as imagens salva-telas dos computadores) eu intuitivamente aceitaria. Ora, essas imagens naturais transmitem as idéias de fartura (tudo verde e florido), são imagens ensolaradas (vida brotando!), recursos naturais abundantes, e em geral nessas imagens nada nos diz que se trata da morada preferida dos tiranossauros ou dos tigres de dente de sabre! Realmente um ambiente saudável e protegido nos acalma e nos tranquiliza. Será que a simetria acalmaria o homem do passado? Duas montanhas iguais? Árvores naturalmente simétricas? um conjunto simétrico de rochas (se possível fosse). A natureza é pródiga em nos oferecer imagens incomuns, nunca repetidas, de uma criatividade impar. Realmente o homem tende a recriar padrões simétricos de telhados, colunas, construções, adornos pessoais (brincos por exemplo) e parece que o não simétrico traz estranheza ou desconfiança, tipo um sapato de cada tipo ou um meia de cada cor. Talvez o padrão de simetria esteja dentro da mente do homem e em sua auto-imagem (Narciso e sua imagem refletida no lago). Talvez seja permeada pela busca da perfeição, do equilibrado. Talvez a arrumação simétrica signifique a presença de outro ser-humano, organizado, no mesmo ambiente. Um ambiente assimétrico pode trazer um sentimento de apreensão porque possa representar algo muito mais natural do que parece ser. Imaginem um sala-de-estar super-arrumada que tivesse o seu telhado removido e ficasse sob a influência e os humores do clima por anos. Ela realmente não se manteria arrumada. A organização, a arrumação e a simetria, via de regra são obras do ser humano (me lembrei dos entulhos milimetricamente organizados nos subúrbios de Viena). O caos é natural. Então, a obssessão humana em organizar, etiquetar, padronizar seria uma luta inglória contra a ordem natural das coisas do universo?

9 comentários:

  1. Ou uma representação infinitamente menor das regras matemáticas que organizam o universo...

    Os ciclos naturais, as leis básicas da física, o equilíbrio entre as espécies, o conceito de emergência, a possibilidade de se entender as regras do jogo, mas não saber qual será o movimento seguinte do seu oponente, tudo isso dá segurança...

    O que assusta são os tornados, a aleatoriedade de um ser humano que não se enquadra socialmente, ou em um jogo, um oponente que simplesmente se levanta e vai embora no meio de uma partida... mas ainda assim, tais exemplos apenas existem por conta de leis que aplicadas uma em sequencia da outra resultam em tais fenômenos... Mas ainda assim em uma primeira instância se caracterizam como um desequilíbrio...

    Simetria é uma das características do equilíbrio... Aliás, acredito que sua designer não tenha se expressado bem, acredito que o que ela queria dizer era equilíbrio, pois o equilíbrio aplicado em uma composição estética, independente de qual seja o suporte pode, aplicado por um profissional bacana, pode sim acalmar... Mas também é possível perturbar tenho com conceito o equilíbrio, depende apenas do tema. (rs)

    Minha opinião sobre a simetria... Caso seja de fato simetria (insisto em dizer que acredito que ela tenha se expressado mal... mas enfim, caso não...), troque de designer... Simetria EXTREMA, aprisiona, contém, mata a idéia de movimento e fluidez, é ríspida, é apenas suporte de pessoas, ou do tempo e não suporte da vida em si... Simetria pode ser aplicada em nixos de um composição equilibrada, mas temos exemplos arquitetônicos que como a simetria falha... Basta ir pra Brasília, tendo como referencia São Paulo, Rio de janeiro, Salvador... A arquitetura padrão, embora tenha sido criada dentro de uma poética "moderna", tem como base o construtivismo, como é passar uma, duas, três semanas em Brasília? Ou então um exemplo um pouco mais prático... O conceito de cubo branco ainda praticado em muitos espaços expositivos... O que sentimos em espaços assim? Ficamos relaxados? Sentimos segurança? Somos parte daquele ambiente? Ou visivelmente a função simétrica e funcional de fazer com que o observador isole a obra de tudo o que a rodeia (trânsito, barulho, chiclete, cachorros, presente, sua própria vida) é algo positivo para o mesmo?

    Mas é apenas uma opinião pessoal sem muitos fundamentos sólidos e conceituais... Coisa boba...

    ResponderExcluir
  2. mais uma coisa... parabéns pela nova cara do blog!!! Está muito mais fácil de ler! E os textos são sempre muito bacanas!

    ResponderExcluir
  3. Grande Sérgio,

    Eu sempre falo para o Carlos que o renascimento, com toda a proporção áurea de Da Vinci, prezando a simetria, nos traz uma sensação muito melhor do que os monstros paralíticos que ele tem pintado... mas fazer o quê, não é? É o que o Carlão gosta de fazer.... Ele quer causar estranhamento e agitação... eu acredito que você poderia pendurar um quadro do seu irmão (qualquer uma daquelas múmias passando por convulsões) em seu consultório... imagina o estado em que os pacientes vão ficar...rsrs.... Da Vinci x Bosch + Schiele + Picass na fase de desfiguração... qual escolher? Rsrs.. Grande abraço a você e ao Carlos. Fu

    ResponderExcluir
  4. a simetria ou equilibrio talvez nao tenham todo esse poder que vcs falam. nao seriam 'sujeitos', e sim , mais uma consequencia e necessidade humana. devemos desvincular tbm da ideia de caos. o que tento explicar é que antes de mais nada a organizaçao e sistematizacao(incluindo a classificaçao, a simetria , o equilibrio) sao necessarias nao por um simples valor intriseco a eles mesmos, mas seriam a forma como a mente humana consegue captar as informaçoes do mundo externo, e ate mesmo se refletir e analisar no seio interno. nesse contexto, todos esses instrumentos de assimilaçao tanto do mundo externo quanto de si mesmo, nao seriam somente a busca pelo distanciamento do 'caos'(nao utilizo aqui a noçao de 'Caos'), ams antes de mais nada o primeiro instrumento de 'um' ser humano em 'uma' realidade. ate mesmo um quandro com formas totalmente abtratas(se é que posso usar isso como exemplo) ou que mantem ente suas cores e formas um conflito que nos parece ininteligiveis, estariam perfeitamente organizados segundo os criterios de assimilaçao por parte da mente humana. eles epresentariam para o apreciador da imagem justamente o que queriam e deveriam representar : o conflito, a abstraçao, ou a inteligibilidade. pois nao haveria outra forma do pintor conseguir retrata-los. alias, nao existiria outra forma, pois essa é a unica disponibilizada pela mente, a unica forma pela qual ela consegue assimilar aquela determinada sensaçao e/ou informaçao. garanchos seriam tao sistematizados quanto um Da Vinci, Rothko, ou Dalí.

    (fui muito simplificado, espero que a cada palavra escrita em 'singular' entendam que na verdade queria dizer um 'plural'. assim a magnitude de possibilidades que tentei expressar sera alcançada. a simplificaçao foi por si só, uma forma de tentar me expressar e entender de forma menos erronea possivel, ou melhor, menos inteligivel possivel

    ResponderExcluir
  5. Concordo com a idéia que a simetria tenha se tornado uma necessidade humana, mas me pergunto: desde quando, no desenvolvimento do hominídeo/homem? Por que essa idéia passou a ser comum a todos os seres humanos (com ápices dessa prática durante o classicismo e o neoclassicismo/renascimento). E naturalmente, as reações em contrário afirmando que há espaço dentro do humano para o assimétrico, desordenado, desequilibrado. Em minha área isso corresponde às fases onde a sociedade buscou integrar o desequilibrado, louco, “fora de esquadro”, com o Foucault, com o movimento anti-psiquiatria, com os atendimentos ambulatoriais, com a toy art. Acredito que a grande tendência universal à entropia, à desorganização aparente com uma organização ao acaso e sutil é a regra. Assim são os fractais e Pollock, por mais que não houvesse uma clara consciência por parte dele. Estudiosos encontraram padrões repetitivos na obra de Pollock (como em toda a natureza). Acho difícil conceber a idéia de um movimento anormal, “inatural” , completamente novo e inusitado se isso ocorre dentro de nosso universo, um sistema fechado. Provavelmente todos os fenômenos aqui encerrados respeitem essas leis da física, da química e da matéria. Claro, que algumas manifestações da matéria podem ser ainda desconhecidas por parte dos seres humanos. O cara que descreveu o DNA, Watson, sonhou com o desenho da dupla hélice. O sonho tem a capacidade de dar esse caráter de novo, criado, do nada, inusitado ,mas na realidade não o é. Talvez seja apenas incomum. O que aconteceu foi que o cérebro dele juntou informações adquiridas durante os seus momentos de consciência e as processou criativamente gerando uma informação aparentemente nova (a dupla hélice seria o rastro desenhado pela hélice com 2 pás de uma embarcação). Para finalizar, minha hipótese é que a simetria é uma busca humana, um comportamento depurado ao longo da evolução da espécie, não algo intrínseco ao animal ou uma regra natural, ou seja, a busca da simetria caracteriza o “humano, demasiado humano”. Se entendi bem meu caro anônimo, você defendeu que a busca da simetria é parte importante do processo de individuação ou de subjetividade, algo que em nosso ontogênese ocorre precocemente. São algumas idéias kleinianas?
    Mais provocações.

    ResponderExcluir
  6. Talvez minha visão seja limitada, mas consigo detectar padrões de equilíbrio, simetria, padrões e cadeias se repetindo por toda a natureza... Da formação de nuvens (tendo como gancho os fractais ou a teoria do caos), os peixes palhaço do pacífico, nossa própria espécie enquanto forma, ou padrões sociais humanos ou não...

    Padrões formam nuvens, leis formam nuvens (independente de como as mesmas se apresentam aos nossos olhos), padrões e leis criam fractais, alguns deles criados por nós, outros criados pela própria natureza... Repetir uma conta cria um resultado e muitas vezes não é possível prever tal resultado, mas ao menos sabemos ou imaginamos qual seria a fórmula... Não vejo isso como imposição do humano para o humano, mas sim uma condição natural da existência...

    Um peixe palhaço cor de rosa e com três caldas fatalmente morrerá sozinho, sem o carinho e afeto de uma palhacinha (rs)... Uma criança com três braços e uma cabeça do tamanho de uma caixa de água se transformará em um adulto assimétrico muito perturbador... SEria perturbador hoje, 500 anos atrás, 4 mil anos atrás... Seria um australopitecíneo assustador...

    O que escapa as regras assusta... eventualmente traz desconforto, atenção... Isso não é novidade... Aliás provocar o estranhamento é uma das mais utilizadas ferramentas conceituais da arte, em alguns casos é a única coisa que existe, quase que uma ferramenta avessa a publicidade, mas com resultado similar...

    Bem... Voltando ou tópico... "Simetria", equilíbrio estético, boa composição de elementos físicos em um ambiente de espera, utilização de formulinhas mesclando diferentes texturas que se somem e criem a noção de unidade, funcionam... São regras, convenções, repetidas inúmeras vezes em revistas de decoração de ambientes (logo, não são estranhas e pode se dizer que totalmente referenciais uma vez que as mesmas sejam reproduzidas tb em novelas, etc), eventualmente provindas de algum estudo fundamentado... Tão fundamentado quanto os padrões dos peixes palhaços, a formação fractais ou nuvens, seguinto uma regra compositiva... Sendo uma forma bem leve de representação das leis universais... Isso, deixa seus pacientes tranquilos, não estão no meio de peixes palhaços com três caudas...

    De forma quase boba penso que e de certa forma afirmando algo citado no texto original... O ser humano precisa de padrões em todas as suas experiências estéticas, caso queira que o mesmo fique em estados que os aproximem da segurança e até tranquilidade... Sem muito o que pensar, apenas certo de que aquele espaço (a recepção) é um espaço que não o desafie em nenhuma instância...

    Pollock sabia exatamente o que estava fazendo, tinha total controle sobre seu processo... e quando perdia tal controle... queimava a tela. Sim, havia um padrão, imposto por ele, a ele mesmo. Mesmo artistas como Joseph Beuys... Criam padrões dentro de suas poéticas, processos... Existe estrutura mesmo dentro do que golpeia as estruturas já existentes... Caso contrário, sem padrões, cadeias, sequencias, novos organismos (na arte, na sociedade, na biologia, na matemática) não sobrevivem, logo, deixam de existir...

    Ou seja, penso diferente... Não acho que simetria, equilíbio, estrutura, cadeia, seja uma busca humana, ou comportamento adquirido ao longo de nossa evolução... Mas sim uma ínfima e natural tentativa de representação do que de fato existe, para aí sim nos postar diante da realidade como parte dela de forma consciente, trazendo com isso um certo conforto.

    ResponderExcluir
  7. "Então, a obssessão humana em organizar, etiquetar, padronizar seria uma luta inglória contra a ordem natural das coisas do universo?"

    Acredito que seja o contrário... A obssessão humana em organizar, etiquetar, padronizar seria uma luta inglória A FAVOR da ordem natural das coisas do universo.

    ResponderExcluir
  8. Na Alemanha aprendi a odiar as simetrias. Esse exagero de disciplina e organização acaba sendo prejudicial, porque a intenção é simplesmente a de satisfazer uma compulsão estética.

    Os alemães, coitadinhos, procuram a simetria porque ela é reconfortante, é um padrão. Identificado o tal padrão, tem-se a impressão de que é perfeitamente possível compreendê-lo. A sensação de entender torna a nossa assimétrica vida muito mais suportável.

    Ao ler um pouquinho sobre o assunto, acabei encontrando um site muito interessante de um psicólogo norte-americano: http://www.righthandlefthand.com/.

    Beijos e parabéns pelo blog!

    ResponderExcluir
  9. Outro dia estava pensando nisso.
    Pq decoramos nossas casas, escritorioas etc? Só para ficar na moda? Ficar do jeito q a gente gosta? etc.
    Mas esses dias estava pensando nisso, "como me sinto bem na decoração da minha casa", os anos passam e eu continuo me sentindo bem "é a minha cara" mas vai alem disso, as "simetrias" e as "cores da" das paredes me fazem sentir bem... alem de ser o meu "cantinho".

    ResponderExcluir